
Já da estrada, o visitante vislumbra um cenário insólito. Esculturas em madeira bruta expostas a céu aberto, dispostas nas laterais do acesso à residência do artesão, como a prepararem um corredor que envolve e acolhe aqueles que cruzam o estranho umbral.
Ao atravessar o caminho, o visitante sente-se como quem observa cenas de um mundo incomum, ao mesmo tempo em que é observado por seres bizarros. Contudo, à medida que o impacto inicial se dissipa, é possível perceber que as esculturas refletem a vida do sertanejo, em suas mais diversas manifestações sócio-culturais, construindo um universo que materializa o imaginário nordestino.
As peças, praticamente em estado bruto, são apenas readaptadas para sua nova existência, re-significadas para integrarem este mundo particular e único. O próprio artista afirma: “A inspiração nasce da visão. Então, numa árvore dessas, eu vejo todo tipo de escultura que eu posso aproveitar. Só de olhar, eu já sei o que eu vou fazer e qual a história de cada peça”.
É neste mundo que o artista vive: “Aqui eu converso com eles. Eles têm vida, têm alegria, têm tristeza. Cada peça dessas é uma pessoa, é um filho, é um irmão, é uma família”.
Com isso, Véio redimensiona o princípio de atemporalidade da arte, uma vez que suas peças não permanecerão para outras épocas. O próprio artista afirma: “Ninguém é eterno. Então aqui morre peça, se acaba peça e nasce peça. Então, enquanto tem uma se deteriorando, se acabando, ficando velhinha, eu vou chegando todos os dias com novas peças para irem substituindo. Não substitui a peça, mas coloca no elenco uma família que morre e que nasce também”.
Assim, suas peças, expostas a sol e chuva, têm vida curta, adoecem, envelhecem e morrem. E este mundo extraordinário só permanecerá existindo enquanto a mão do artista, tal qual uma mão divina, o mantiver em movimento.
Felizmente, há registros que guardarão para a posteridade esta obra magnífica. Um deles é o filme VÉIO*, de Adelina Pontual, produzido pela REC Produtores Associados e CHÁ Cinematográfico (PE), sob o patrocínio da PETROBRAS. O documentário retrata, de uma forma simples e sutil, todas as nuanças da obra desse artesão magnífico. Vale a pena conferir.
*Roteiro e direção: Adelina Pontual
Produção: João Melo Vieira Jr.
Produção Executiva: Chica Mendonça e Nara Aragão
Direção de Fotografia: Jane Malaquias
Montagem: João Maria
Som direto: Pedrinho Moreira
Trilha original: Tomaz Alves Souza
[Publicado originalmente em Abril/2008]
Pena que esse grandioso artista e o seu trabalho magnífico ainda careçe de reconhecimento por parte dos glorienses. Véio e suas peças representam parte da história e do cotidiano do homem do sertão.
ResponderExcluirProf. Caio César Gomes
CESAD/UFS/DHI.